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O Projeto de Lei (6299/2002) altera o controle da autorização de novos agrotóxicos no Brasil e flexibiliza a adição de novos produtos nocivos à saúde humana.

A Câmara dos Deputados aprovou, na última semana, o Projeto de Lei que flexibiliza o controle e a aprovação de agrotóxicos no Brasil. A maioria dos deputados apoiou a mudança – 301 contra 150, além de duas abstenções. Em 2016, o “PL do Veneno”, como é conhecido, já havia sido aprovado, mas, por ter sofrido alterações recentes, volta ao Senado para uma nova avaliação.

O PL 6299/2002 tem como relator do texto o deputado Luiz Nishimori (PL-PR) e altera o controle da autorização de novos agrotóxicos no Brasil, que atualmente é uma atuação direta do Ministério da Saúde, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), do Ministério do Meio Ambiente e do Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais); transferindo toda responsabilidade para o MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento).

O projeto é alvo de críticas por fragilizar ainda mais uma legislação já considerada fraca por especialistas. “O texto não cobre as lacunas de fiscalização, monitoramento e reavaliação de produtos, que já são precárias, e ainda retira o pouco de proteção que a população tinha”, avalia a engenheira agrônoma Marina Lacôrte, porta-voz de agricultura e alimentação do Greenpeace Brasil e mestre em ecologia. O depoimento foi dado ao site BBC News.

Se a proposta for aprovada, os demais órgãos públicos ainda poderiam emitir pareceres e alertas de risco sobre as substâncias, mas a competência de multar empresas e institutos de pesquisa passaria a ser somente do MAPA. E logicamente que o Ministério da Agricultura, principalmente no atual governo, está inteiramente interessado na aprovação desse PL, já que beneficia a bancada ruralista – financiadores diretos da campanha bolsonarista.

“O MAPA é quem avalia a eficiência da molécula do ponto de vista agronômico. Além disso, suas aprovações podem estar ligadas a interesses comerciais. Desde governos passados não temos políticos isentos no ministério, mas sim pessoas ligadas à bancada ruralista, que defendem esse modelo agrícola de commodities. É a raposa cuidando do galinheiro”, diz a porta-voz do Greenpeace.

Outras mudanças perigosas

Apesar de a Constituição Federal categorizar esses produtos como “agrotóxicos”, o relator do pacote do veneno, Luiz Nishimori, altera o termo na lei para “pesticidas”. O deputado justifica a mudança como um acompanhamento das tendências mundiais, o que não é verdade e essa desculpa esfarrapada está sendo utilizada para favorecer o grande mercado.

Na nova versão, a vedação da importação e produção de agrotóxicos restringe-se ao termo generalista de “riscos inaceitáveis”. Atualmente, a lei define a proibição para agrotóxicos que revelem características teratogênicas, carcinogênicas, mutagênicas e causem distúrbios hormonais e danos ao aparelho reprodutor.

A matéria estipula prazos mais rápidos (de até dois anos) para os registros dos agrotóxicos pelos órgãos federais, o que poderia prejudicar estudos toxicológicos mais robustos. Quando não houver manifestação conclusiva dentro dos prazos estabelecidos, o agrotóxico receberá uma autorização temporária.

O alerta dos especialistas

Especialistas da área da saúde e do meio ambiente afirmam que a população geral – e o planeta como um todo – tendem a ser prejudicados. “A questão central dessa mudança no texto é que quem decide o que vai ao não ao mercado é o Ministério da Agricultura. Se a avaliação dos outros órgãos indica alta periculosidade, mas o MAPA decide que o produto é economicamente interessante, ele pode acabar passando”, indica Luiz Cláudio Meirelles, pesquisador da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz.

O Inca (Instituto Nacional do Câncer) aponta que toda a população está suscetível a exposições múltiplas a agrotóxico por meio de consumo de alimentos e água contaminados. Entre os principais efeitos à saúde, o instituto lista os de nível agudo, como irritação na pele, desidratação, alergias, ardência do nariz e boca, tosse, coriza, dor no peito, dificuldade de respirar, irritação da boca e garganta, dor de estômago, náuseas, vômitos, diarreia, dor de cabeça, transpiração anormal, fraqueza e irritabilidade.

Já entre os efeitos crônicos, que aparecem após exposições repetidas a pequenas quantidades das substâncias por um período prolongado, são relatados os seguintes sintomas, de acordo com a Anvisa: dificuldade para dormir, esquecimento, aborto, impotência, depressão, problemas respiratórios graves, alteração do funcionamento do fígado e dos rins, anormalidade da produção de hormônios da tireoide, dos ovários e da próstata, incapacidade de gerar filhos, malformação e problemas no desenvolvimento intelectual e físico das crianças e risco aumentado para câncer (em determinados grupos de agrotóxicos).

A doação recebida pelo relator em troca de apoio

Uma reportagem do portal Brasil de Fato, aponta que o deputado Nishimori recebeu R$ 380 mil de empresários e executivos do agronegócio na campanha que o levou à Câmara dos Deputados, em 2018.

Todas as 10 doações individuais recebidas pelo relator do pacote do veneno na campanha eleitoral provêm de figuras ligadas ao setor. A informação foi extraída no DivulgaCand Contas, plataforma do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), e cruzada com informações públicas.

As doações ocorreram dentro da lei, e estão registradas na Justiça Eleitoral. Mas não deixa de levantar suspeitas. A maior doação foi de R$ 80 mil, feita por Anildo Kurek, sócio da FTS Sementes e da Elaine Agropecuária. Outros cinco empresários do agro doaram R$ 50 mil, e quatro pagaram R$ 25 mil à campanha do deputado federal. Nishimori ainda recebeu outros R$ 2 milhões da Direção Nacional de seu partido, o PR. Depois, a sigla mudou de nome para PL e passou a abrigar Jair Bolsonaro. Confira abaixo, a relação completa das “doações”:

Agora, a pauta vai ao Senado. O avanço se soma ao cenário preocupante em com mais de 2 mil agrotóxicos liberados nos últimos quatro anos, durante a gestão de Jair Bolsonaro, um recorde negativo para a saúde humana e para o meio ambiente.

A AEPET-BA seguirá de olho no tema e seguirá contra o PL do Veneno, em defesa da vida e do meio ambiente.


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