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A democracia é um regime de governo que não se sustenta por elementos propriamente materiais, muito antes a democracia é um valor simbólico de poder coercitivo entre todos os indivíduos de uma sociedade, de modo que não importa os prédios, não importa as estruturas, nem mesmo as leis. A democracia se sustenta na crença coletiva de que este é o melhor modo de gestão pública; é a melhor forma do controle social ser exercido sob os poderes políticos de maneira a constituir uma sociedade onde os valores humanitários e os valores civilizatórios são determinantes e superam os valores da força bruta do poder e da barbárie.

Há uma semana, no domingo, dia 08 de janeiro de 2023, o arbítrio e o ataque a democracia não acharam amparo na nossa constituição e nem nas nossas leis. O que houve foi propriamente um ataque direto a um núcleo central daquilo que nos faz uma sociedade. O regime democrático exige dos poderes públicos políticos observância permanente e defesa incondicional da forma com que nós todos nos relacionamos, portanto, democracia é antes de tudo e para todos uma crença simbólica, um valor universal onde nos reconhecemos como iguais, com direitos e deveres iguais. Os atos praticados no domingo são a coroação de um processo de corrosão democrática iniciada no Brasil, com o objetivo claro de atacar a democracia para impedir que aquele que efetivamente foi eleito para o cargo de presidente da República, pudesse exercer o posto mais alto que alguém pode ocupar na política de um regime democrático e republicano.

O processo de corrosão democrática não começou com os atos do dia 08 de janeiro, mas sim quando no julgamento do Mensalão se permite a teatralização e o direito penal do espetáculo, para que o mesmo fosse utilizado como instrumento para punição daqueles contra os quais não havia prova retumbante. Não satisfeito com isso, os objetivos de ferir a constituição e a democracia continuaram sendo dilacerados no processo mais escandaloso do judiciário brasileiro, que foi a Lava-jato.

A Lava-jato foi senão o processo de esgarçamento, onde inclusive o Supremo Tribunal Federal (STF) foi por muitas vezes publicamente constrangido a adotar medidas – conforme ao que se chamaria de clamor popular -, onde uma minoria organizada e barulhenta impõe sobre toda a sociedade desígnios políticos por meio do exercício do poder judiciário e a utilização do direito processual penal como instrumento de destruição deste ou daquele governo, como elemento de constituição de objetivos políticos através do uso do poder de estado para interferir nas decisões democráticas. No caso, a eleição da presidenta Dilma Rousseff constitui outra prova inequívoca do esgarçamento democrático em que o Brasil vive. Por último, mas não menos importante, o processo de impeachment, a colocação no poder de um governo ilegítimo conspirador e que o único objetivo era anacronicamente restabelecer os parâmetros do neoliberalismo mais covarde e mais ultrapassado no Brasil.

Não se pode distinguir os atos de destruição dos bens patrimoniais da União (Congresso Nacional, Supremo Tribunal Federal e Palácio do Planalto), da destruição dos direitos sociais nas reformas perpetradas pelo golpista Michel Temer, um governo claramente constituído por um processo de fake news tolerado pelo sistema político democrático como meio de impedir a eleição do PT. O direito penal deve imputar propriamente a cada um daqueles acusados as penas culminadas pela lei à medida da sua culpabilidade. É preciso que todos que participaram de todos os atos desde a ocupação das frentes de quartéis, até a obstrução de vias pedindo o golpe militar, sejam propriamente imputados nos crimes que comentaram de mesmo modo os agentes públicos, inclusive os oficiais militares, que conviveram com a ocupação do espaço público –  área de segurança nacional, sem tomar as medidas cabíveis para obstruir, sejam responsabilizados, tanto do ponto de vista administrativo (com a perda do cargo ou a reserva compulsória) quanto do ponto de vista criminal, de modo que os poderes constituídos retomem a sua normalidade constitucional e penal.

E que os acusados não possam nem se utilizar do direito penal como instrumento político e nem se utilizar da leniência com o crime como obtenção, fragilização e instabilização do poder legitimamente constituído. A sociedade brasileira precisa de uma vez por todas passar a limpo a sua história de modo a não haver brandura nem com quem cometeu e nem com quem mandou cometer, incluindo aqueles que permitiram o crime acontecer, pois também precisam responder proporcionalmente às suas responsabilidades desde o soldado até a mais alta patente. Todos são responsáveis pelo crime de prevaricação. O pedido de intervenção militar e a excitação das forças armadas contra a ordem democrática é crime e precisa ser tratado sem qualquer tergiversação. Não se trata de buscar apenas os mandantes, mas de apurar a responsabilidade de todas e todos que participaram dos atos ilícitos, tanto na condição de mandantes quanto na condição de participantes de organização criminosa quanto pelos atos praticados diretamente.

A AEPET Bahia reafirma o seu compromisso democrático e não por outra razão enviou delegação à posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva. A delegação compareceu não como ato de apoio a este ou aquele governo, mas como um ato inequívoco de defesa da democracia. Não fosse a manifestação da sociedade no dia 1° de janeiro de 2023, talvez a própria posse tivesse sido marcada por estes atos, o que provavelmente impediu foi a compreensão de toda a sociedade de que a democracia é o bem maior e que suplanta a sua conveniência e convergências políticas. É preciso defendê-la porque a democracia é o único meio pelo qual os trabalhadores e a sociedade podem legitimar e reivindicar os seus direitos.

A AEPET Bahia reitera a sua independência política de todos os governos e a sua defesa incondicional da Petrobrás e a retomada do patrimônio do povo que foi vendido pelos vândalos da economia que depredaram o patrimônio público. O patrimônio público tem sido objeto permanente do vandalismo dos liberais do século passado, dos canalhas que utilizam do poder público como meio de enriquecimento ilícito e agora dos golpistas antidemocráticos.

A venda da refinaria pelo preço vil tal como foi feito é um ato inequívoco de vandalismo e precisa ser questionado em todos os espaços políticos seja no executivo ou no legislativo de modo a imputar a responsabilidade de quem os cometeu, reconstituir o patrimônio da sociedade e recompor o patrimônio do povo. Aqueles que vandalizam os bens públicos precisam responder criminalmente e administrativamente, sejam eles servidores ou empregados públicos tendo participado direta ou indiretamente e ainda responder civilmente para recompor o patrimônio. Não pode a sociedade pagar pelo ônus de vândalos, que depredaram a nossa economia, que vandalizaram a nossa lei penal, que vandalizaram os três poderes, invadindo as casas representativas.

A democracia não se faz por prédios públicos, mas a inviolabilidade dos espaços democráticos é uma exigência e para que isso aconteça exemplarmente deve ficar registrado na história que aqueles que atentaram contra a democracia respondam criminalmente e civilmente, e os servidores públicos, tendo participado de modo omissivo ou comissivo, também respondam administrativamente para que outros ataques a democracia não ocorram, mas dizer isso também significa dizer que os vândalos da CLT, os vândalos do patrimônio do povo, os vândalos da Petrobrás, os vândalos da Eletrobras também precisam responder e o bem do povo precisa a voltar a ser do povo.


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