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Assange sofre perseguição política há mais de 10 anos por tornar públicos os documentos que comprovaram violações cometidas pelo governo dos EUA contra populações e governos

Belo Horizonte, Brasília, Recife, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre foram as capitais brasileiras que sediaram protestos favoráveis à liberdade de Julian Assange, fundador do Wikileaks. Ele foi responsável por tornar públicos os documentos que comprovaram violações cometidas pelo governo dos EUA contra populações e governos. Por isso, Assange encontra-se preso em uma penitenciária de segurança máxima, no Reino Unido. Mas existe muito mais coisas envolvidas para além da prisão arbitrária.

Para quem não estava acompanhando muito o caso na época, até o governo brasileiro foi alvo das violações expostas pelo fundador do Wikileaks após longa investigação jornalística, durante os mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e da presidenta Dilma Rousseff.

Os documentos vazados revelaram inúmeras as ações de espionagem do governo norte-americano contra membros do governo e contra a Petrobrás.

Os atos pela liberdade de Assange foram realizados em frente aos consulados e às embaixadas do Reino Unido e dos Estados Unidos, no fim de fevereiro. A mobilização faz parte do Dia Internacional de Mobilizações para Liberdade de Assange. No restante do mundo, as mobilizações chegaram em várias cidades como Bogotá, Buenos Aires, Joanesburgo, Nova York, Kathmandu e Cidade do México.

Nos Estados Unidos, a mobilização teve seu momento mais histórico e com muita simbologia. Reuniram-se jornalistas, políticos e juristas, em Nova York. Eles se encontraram em frente ao Tribunal de Belmarsh, instância judicial simbólica inspirada pelo Tribunal Russell-Sartre de 1966, quando representantes de 18 países se reuniram para responsabilizar os EUA por seus crimes na guerra no Vietnã.

De acordo com a Assembleia Internacional dos Povos (AIP) e a Internacional Progressista, que organizam a mobilização internacional, o objetivo é cobrar a libertação definitiva de Assange, que é perseguido pelo governo dos Estados Unidos há 12 anos.

Até 2019, Assange estava asilado na embaixada do Equador, em Londres, mas o asilo político foi revogado e ele acabou ficando detido em terras britânicas. Atualmente, o ativista luta para não ser extraditado para a terra do Tio San, onde deverá cumprir pena de prisão perpétua. Em janeiro, a Justiça britânica autorizou Assange a recorrer à Suprema Corte contra a decisão sobre sua extradição, determinada no final de 2021.

Wikileaks e a Petrobrás

O Wikileaks prestou um enorme serviço à democracia e transparência mundiais ao expor, sem travas, milhares de documentos sigilosos e troca de correspondência entre autoridades e agências do governo dos Estados Unidos, como a NSA (National Security Agency) e políticos dos mais variados países, inclusive do Brasil. Em dezembro de 2010 tornou pública a mensagem do consulado dos EUA no Rio de Janeiro a Washington com o título “A indústria de petróleo vai conseguir combater a lei do pré-sal?”.

O documento fazia análises sobre o interesse norte-americano e suas petrolíferas (Chevron e Exxon) e revelavam a insatisfação dessas companhias com a lei de partilha – em especial, com o fato de a Petrobrás ser a única operadora – e como elas atuaram fortemente no Senado para mudar a lei. “Eles são os profissionais e nós somos os amadores”, teria afirmado Patrícia Padral, diretora da americana Chevron no Brasil, sobre a lei proposta pelo governo. Segundo ela, o tucano José Serra teria prometido mudar as regras se fosse eleito presidente. (https://wikileaks.org/Nos-bastidores-o-lobby-pelo-pre.html)

Assange também denunciou o envolvimento dos Estados Unidos no golpe que derrubou Dilma Rousseff. Em entrevista ao jornalista Fernando Morais, do blog Nocaute, o fundador do Wikileaks afirma: “(A descoberta do pré-sal) faz com que outros partidos queiram reduzir o poder da Petrobrás, tirando os ganhos dela. Uma maneira de trocar favores com os Estados Unidos é facilitar à Chevron e à ExxonMobil o acesso a partes desse petróleo. Nas mensagens vazadas por WikiLeaks aparece um desejo constante das petroleiras americanas de ter o mesmo acesso ao pré-sal que a Petrobras tem”.

Ele também revelou que Michel Temer, pelo que pode ser lido em documentos da NSA, foi, em janeiro de 2006, à Embaixada dos EUA no Brasil e passou informações sobre o governo brasileiro. “Ele foi à embaixada americana várias vezes para falar. Isso mostra um grau um pouco preocupante de conforto dele com a embaixada americana. O que ele terá como retorno? Ele está claramente dando informações internas à embaixada dos EUA por alguma razão. Provavelmente para pedir algum favor aos Estados Unidos, talvez para receber informações deles em retorno”, afirmou Assange.

A farsa do caso Assange

Na teoria, o bom jornalismo se faz com boas análises, imparcialidade, compromisso com a verdade e muita investigação. Foi isso que Assange, fez ao investigar e tornar públicos os documentos que comprovaram violações cometidas pelo governo dos EUA contra populações e governos. Mas, aqueles que deveriam ser investigados, estão fazendo de tudo para calar a voz não somente do fundador do WikiLeaks, mas de todos os jornalistas ao redor do mundo.

Assange sofre uma perseguição política há mais de 10 anos. Ao longo desse período, contudo, os crimes contra a humanidade em guerras e espionagens dos Estados Unidos, que foram revelados pelo seu trabalho jornalístico, jamais foram julgados. E pior, o fundador do WikiLeaks não tem sequer acesso ao devido processo legal.

Martonio Mont’Alverne alerta, em entrevista ao Jornal Brasil Atual, que o ponto mais grave, é o julgamento do jornalista abrir um “precedente terrível” para os direitos humanos caso se permita a extraterritorialidade da aplicação da lei estadunidense a supostos crimes cometidos fora do país. Ele lembra que a justiça do Reino Unido está julgando um pedido de extradição de um cidadão que é na verdade australiano para aplicação de uma disposição normativa dos Estados Unidos.

“Isso se configuraria no seguinte caso: em um país, por exemplo, a Arábia Saudita, ela poderia também requerer a aplicação da legislação dela por um tribunal brasileiro sobre um cidadão de qualquer país. Isso abre um precedente inédito no âmbito dos direitos humanos e penal que tem toda uma tradição de estrita legalidade”, adverte o advogado.

Além disso, o julgamento de Assange também atenta contra a liberdade de imprensa e de expressão, segundo Mont’Alverne. O que torna o caso do jornalista ainda mais “emblemático” para o direito internacional e os direitos humanos.

Para Sergio Amadeu da Silveira, colunista do blog A Terra é Redonda, o Wikileaks é uma organização que visa publicar vazamentos de organizações poderosas, tais como Estados e grandes corporações. O critério de publicação da organização é que os conteúdos sejam comprovadamente verdadeiros e relevantes para a opinião pública mundial.

Assange está sendo acusado de corrupção à espionagem e o relator de direitos humanos da ONU, afirma que o jornalista australiano é vítima de uma grande farsa, sendo submetido a tortura psicológica.

“Até quando vamos aceitar essa farsa? Até quando podemos ver a vida de uma pessoa destruída por que Washington quer vingança? Podemos continuar aceitando o cinismo como principal estratégia nas relações internacionais comandadas pelos Estados Unidos? Seria a ideia de que as razões de Estado estão acima do direito dos povos a obter informação verdadeira ainda válida? Legitima?”, questiona Sergio Amadeu.

Leia mais: O caso Assange (https://aterraeredonda.com.br/o-caso-assange/?doing_wp_cron=1645805896.5700879096984863281250)

(Com informações de Norian Segato)

 


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